Domingo, 8 de Julho de 2007

Vamos todos dar as mãos e cantar uma cantiga

Geralmente preocupo-me com o ambiente (em especial com a vida animal) e, por isso, decidi ver um pouco do Live Earth. Foi uma decisão que mantive durante pouco tempo, porque apesar dos meus interesses ambientais e musicais, a minha paciência para aturar as hipocrisias associadas tem limites.

Chateiam-me solenemente as mensagens de rodapé do tipo "acendam velas porque é romântico e gasta menos energia", "separem o lixo", "usem energia solar", and so on... Será que estas pessoas querem convencer-me que não vão de carro para o trabalho, que não usam roupas e sapatos que implicam a morte de animais e gastos energéticos, que não usam ambientadores e desinfectantes e que, se tiverem publicidade no pára-brisas do carro, guardam o papel para levá-lo ao ecoponto? Já para não falar que, para mandarem as sms para o programa, utilizaram o telemóvel e, consequentemente, gastaram energia. Algumas sugestões: vamos demolir as casas, plantar árvores, despir as roupas, e vamos viver para o bosque, com uma mão na frente e outra atrás, esperar que a fruta caia das árvores para podermos comê-la.

E o argumento do "vamos fazer um mundo melhor para os nossos filhos e netos". Mas filhos e netos de quem? Se eu não tiver filhos nem netos posso estar-me borrifando? Perguntem aos vossos filhos e netos se gostavam de viver sem televisão, computador, leitor de DVD, mp3, playstation, etc. Depois digam-me as respostas para eu ver se os filhos e netos estão, de facto, interessados em viver num mundo melhor, ou se simplesmente querem viver confortavelmente no mundo que têm. Abdiquem das comodidades primeiro e depois, quando estiverem de novo no tempo das cavernas, a matarem-se à mocada por um naco de carne crua, vejam lá se não preferiam a carninha comprada no supermercado, para o qual se deslocaram de carro, que transportaram em sacos de plástico, que é preparada num fogão e à qual juntam uma quantidade de ingredientes manipulados industrialmente e embalados.

E a propósito de comida, para mim o cúmulo foi quando o Nuno Markl disse que tinha ido comer uma carcaça e que tinha mandado um bocado fora, ao que a Catarina Furtado perguntou se ele tinha dado um beijinho no pão antes de o pôr no lixo. Isto porque, segundo ela, tinha mandado fora algo indispensável e que fazia falta a muita gente... Acho que os neurónios da Catarina estavam em greve ou em Hamburgo a ouvir algum concerto! Em primeiro porque, se até para os animais "os restos não são uma alimentação completa", acho que a suposta solidariedade da Catarina devia levá-la a dar aos pobrezinhos comida em primeira mão, e não aquilo que são os restos dos outros. Em segundo, imaginem esta situação: eu sou uma criancinha africana (por exemplo, da Etiópia), já vi a minha família toda a morrer pelos mais variados motivos, tenho a barriga grande de fome e já nem tenho forças para enxotar as moscas que tenho à volta dos olhos e, de repente, alguém passa por mim e diz-me "olha, acabei de mandar fora um bocado de pão, mas não fiques lixado porque eu dei-lhe um beijinhos antes, já que é algo tão precioso para ti". Acho que, nesse momento, se conseguisse reunir forças para alguma coisa, seria para partir a cara ao cabrão que me dissesse isso. Depois podia morrer em paz!

Será que a Catarina, quando tiver o segundo filho, vai pari-lo no meio do mato, em sintonia com a natureza? É que nos hospitais produz-se montes de lixo e é chato para o ambiente... E se pensarmos nas fraldas de que vai precisar! É melhor usar as de pano porque as descartáveis poluem mais. Mas as de pano precisam de água para serem lavadas. Oh, dilema! Talvez o melhor seja não ter filhos. Ao menos assim não teria de se preocupar com o planeta que vai deixar para eles...

Continuo a achar, sem muitas preocupações, que o fim do mundo está para breve. Tenciono estar lá e até já consigo imaginar as baratinhas a esfregarem as patinhas de contentamento. Quanto ao Live Earth, valeu pela música. De boas intenções está o inferno cheio.

música: It's the end of the world as we know it (and I feel fine)
publicado por bonecatenebrosa às 22:23
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4 comentários:
De planiciemetalica a 10 de Julho de 2007 às 14:30
Acho que é preciso recordar uma coisa a esses pseudo-ambientalistas de modas de pacotilha: poucas coisas há mais naturais e ambientalmente correctas do que a extinção de espécies. Basta pensarem no registo fóssil (se é que pensam) para terem uma ideia. Desde o início da vida na Terra até ao aparecimento dos hominídeos, desapareceram milhões de espécies, desde dinossauros a bactérias (que, ao contrário do que possa parecer, também deixaram fósseis giríssimos nas praias austalianas). Isto passando por plantas e bichinhos capazes de impressionar os mais criativos escritores de ficção científica. Sem querer abusar de Darwin, isto não é mais que uma selecção natural interespecífica, em que as espécies menos adaptadas ao ambiente são substituídas por outras. E por falar em alterações ambientais, também é preciso relembrar que já aconteciam bruscamente antes do aparecimento do ser humano. Procurem, por exemplo, saber o que acontece quando os polos magnéticos da Terra se invertem; ou leiam o que aconteceu em Krakatoa em 1883.
Quero com isto dizer que, a longo prazo, a extinção da espécie humana as we know it é inevitável. Os dinossauros dominaram a Terra durante mais tempo do que nós, até ao momento, e desapareceram bruscamente. Nós, ou desaparecemos, ou evoluiremos para uma espécie diferente, mas esta última hipótese, pelo grau de tolerância à diferença que vemos todos os dias, parece-me menos provável. Resumindo: que se desenganem os pseudo-ambientalistas, pois a descendência em nome da qual dizem pretender salvar o mundo está tramada.
Claro que também podem seguir a doutrina criacionista, que agora se chama teoria do design inteligente para ver se ganha respeitabilidade ceintífica, e acreditar que Deus criou todas as espécies tal como existem agora e os fósseis são produtos de Satã para enganar os fiéis. Mas se é isso que pensam, é melhor não nos chatearem, rezarem muito e encomendarem as almas aos santinhos da vossa devoção, porque se o Senhor é responsável por tudo, nenhum evento mundial piego-patético fará a mínima diferença.
De facto, se Deus existe, deve adorar a Blattaria (carinhosamente conhecida por baratinha cascuda), que já anda aqui na Terra há 400 milhões de anos, antecedeu os dinossauros e há-de suceder-nos, benza-a o Senhor.
De bonecatenebrosa a 10 de Julho de 2007 às 16:30
Olha, não é à toa que eu já tinha saudades dos teus comentários!
Por momentos, quando começaste a falar de Darwin e da selecção natural, pensei que ias dizer algo do género "eu sou especial e só quero fazer amigos", mas isso agora não interessa nada...
Falas bem, dizes a verdade e, se quiseres, podes-te juntar a mim no clube de fãs do fim do mundo, que estou a pensar formar.
Para acabar com um momento musical:
A Blattaria diz que tem sapatinhos de veludo
lá lá lá
De leprechaun a 21 de Julho de 2007 às 01:08
Mas que Bonequinha deliciosa!!!

Vim visitar-te porque vi o "post estúpido" no blog da Pupita - outra bonequita! - e de facto o teu humor corrosivo é nice!

Será que participas em algum fórum? Seria muitíssimo agradável discutir contigo alguns destes temas que por aqui comentas.

Mas repara, a propósito dessa afirmação da Catarina que tanto te irritou, que há sempre várias maneiras de entender aquilo que é dito. Aqui, satirizas unicamente a interpretação literal dessas palavras, mas esse costume... em desuso, por certo... contém um outro significado muito mais terno que pessoalmente adoro.

Além do mais, esse era também o hábito da minha Mãe e possivelmente a da própria Catarina, talvez...

Como dizes, vivemos nums sociedade de abundância, pelo menos alimentar. No chamado 1º Mundo, dificilmente alguém morre de fome, pelo menos comparativamente a essa situação que também descreves da Etiópia... ou Somália e afins.

Mas nem sempre foi assim e as gerações da 1ª metade do século passado, num país ainda profundamente agrícola e analfabeto, passavam por vezes períodos de penúria alimentar, o que tornava também as populações vítimas mais fáceis de doenças hoje já quase erradicadas, como a tuberculose, pneumonia e as infecções que contribuíam para uma elevada mortalidade infantil.

Ora o pão é o símbolo, talvez universal, do alimento. Sendo este escasso, é claro que seria aproveitado ao máximo. Aliás, na oração clássica do Cristianismo pede-se "o pão-nosso de cada dia". Logo, esse costume ancestral de rezar antes de comer ou beijar o pão que se reparte é, no fundo, um acto belíssimo de reverência e amor. Vá lá, não troces muito dele, a linda Catarina tem mesmo razão... se o disse co'o coração!

Bem, até talvez saibas tudo isto, afinal. Mas esse comentário fez-me recordar a minha Mãe e por isso te respondi e à Sua memória.

Ah! mas comigo podes ser brava, isso é outra história...

Rui leprechaun

(...ó intrépida amazona de alta glória! :))

De bonecatenebrosa a 21 de Julho de 2007 às 15:55
Ena ena, tantos elogios!
Para responder à primeira questão dos fóruns: não participo. Geralmente não passo muito tempo por aqui, por isso não dá. Mas podes sempre colocar comentários, aos quais tentarei responder (na medida das minhas capacidades) e se quiseres sugerir temas podes usar o mail bonecatenebrosa@sapo.pt.
Quanto à questão do pão. Já vi esse gesto ser feito por outras pessoas e, de um modo geral não critico, embora também não concorde porque acho que apenas serve para aliviar consciências. Na prática, não estamos a acabar com a fome no mundo ao beijarmos o pão (ou qualquer outro alimento), estamos apenas a desculparmo-nos quando mandamos comida fora. Ora nós não temos de pedir desculpa pela abundância que temos, quanto muito devemos um pedido de desculpas aos outros por não terem tanta abundância como nós. Logo, o gesto, em si é inútil.
Agora, critiquei o comportamento da Catarina, em particular porque dela, como embaixadora da boa vontade, seria de esperar mais e não somente a sugestão de beijar a comida. Obviamente, também não acho que ela devesse obrigar o Nuno Markl a comer tudo. Mas ela podia sensibilizar as pessoas usando um argumento com mais lógica.
Quando eu não comia tudo o que tinha no prato, a minha avó costumava dizer "come tudo que há crianças a passar fome". Ela dizia isto com a melhor das intenções, mas era um argumento tão inválido como o da Catarina: as crianças não iam ver a sua fome satisfeita por eu estar a comer tudo... Mais uma vez, aliviava a consciência dela, mas não resolvia nada.

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