"O arqueólogo James Mellaart pouca atenção prestara à jovem de cabelo negro sentada à sua frente no comboio de Istambul, até que, relanceando o bracelete que esta usava, percebeu que tinha milhares de anos e era de ouro maciço. Esse olhar iria conduzi-lo a um repositório de tesouros valiosos - e a uma batalha que se prolongou por um ano para se defender contra uma terrível campanha de suspeitas e calúnias.
Seria tudo uma mistificação? Ou seria Mellaart vítima de uma conspiração sinistra para lhe destruir a reputação? Nesse momento, ao contemplar a pulseira da jovem, o arqueólogo não conseguia sequer acreditar na sorte que o bafejava.
Nenhum arqueólogo poderia ter ignorado o bracelete. Enquanto o comboio rolava através da Turquia, Mellaart apresentou-se. A jovem declarou-lhe que o bracelete pertencia a uma colecção que tinha guardada em sua casa e concordou amavelmente em deixá-lo examinar in loco as restantes peças.
Quando o comboio chegou a Izmir, no litoral turco do mar Egeu, nessa noite de 1958, a curiosidade de Mellaart não lhe permitiu sequer prestar atenção ao caminho que o levou, primeiro de ferry e depois de táxi, até à casa da jovem, onde a colecção foi retirada peça a peça da cómoda onde estava guardada.
Mellaart ficou estupefacto. Encontrava-se perante uma descoberta comparável à do túmulo de Tutankhamon. A jovem não lhe permitiu que fotografasse a colecção, mas autorizou-o a permanecer em sua casa a fazer esboços.
Entusiasmado, Mellaart aproveitou a ocasião. Trabalhou incansavelmente dias a fio, copiando os intrincados desenhos das peças fabulosas, decalcando os seus hieróglifos, anotando cuidadosamente os mais ínfimos pormenores.
A jovem, que lhe disse ser grega, informou-o de que a colecção fora encontrada durante a ocupação grega, após a I Guerra Mundial. Provinha de uma escavação realizada secretamente numa pequena aldeia chamada Dorak, situada à beira de um lago.
Para Mellaart, as implicações eram espantosas pois, sabendo que as peças tinham 6000 anos, remontando há Idade do Bronze, deparava-se-lhe a primeira prova de que florescera uma grande cidade marítima perto da Tróia de Homero, governada por uma casta de guerreiros e rivalizando com a própria Tróia em riqueza e influência. Era um sonho de arqueólogo. Todas as teorias deveriam agora ser reformuladas segundo nova perspectiva.
Finalmente, uma noite, a hora avançada, acabou o seu trabalho e partiu. Foi a última vez que viu a jovem e o tesouro. Só muito mais tarde, Mellaart compreendeu quão pouco ficara a saber sobre a jovem que constituía a chave da descoberta que realizara. Apenas se lembrava de que falava inglês com um sotaque americano, que se chamava Anna Papastrati e vivia na Rua Kazim Direk, 217.
O primeiro erro grave em que Mellaart incorreu foi não procurar confirmar estes dados. Mais tarde, os investigadores turcos, que alimentavam suspeitas, declararam que não tinham conseguido encontrar ninguém com aquele nome; além disso, a Rua Kazim Direk, pura e simplesmente, não existia.
O seu segundo erro foi informar com pouca exactidão o seu chefe no Instituto Britânico de Arqueologia em Ancara, Prof. Seton Lloyd. Mellaart, que era o director-adjunto, declarou a Lloyd que encontrara o tesouro 6 anos antes, mas que só então obtivera permissão para publicar a sua descoberta. Era uma mentira inventada por uma razão inocente. Mellaart estava casado há 4 anos e não queria que a sua mulher fosse incomodada com comentários desagradáveis de que passara vários dias em casa de outra mulher.
Mellaart lamentaria profundamente ambos os erros cometidos durante a longa e árdua luta que teve de travar para se ilibar das acusações que lhe foram dirigidas depois da publicação da sua descoberta na Illustrated London News, em Novembro do ano de 1959. Escrevera previamente ao Departamento Turco de Antiguidades a informá-lo sobre a projectada publicação, mas a carta extraviara-se.
Quando o artigo apareceu, com os desenhos de Mellaart, as entidades oficiais turcas ficaram exasperadas. Quiseram saber onde se encontrava o tesouro, onde fora descoberto e porque não lhes havia sido comunicado o facto. Supondo que lhes fora subtraído um precioso tesouro nacional, acusaram Mellaart. O arqueólogo prestou-lhes todo o auxílio que pôde mas Anna, e com ela o tesouro, tinham desaparecido sem deixar rasto.
Não existiam provas que imputassem a Mellaart o desaparecimento do tesouro. No entanto, decorridos 2,5 anos, o arqueólogo viu-se envolvido numa campanha de descrédito, instigada pelo jornal turco Milliyet, que afirmava que a data da escavação de Dorak era falsa e que os achados haviam sido descobertos nos anos 50, altura em que tinham sido vistos próximo do local Mellaart e uma mulher misteriosa de identidade desconhecida.
Provou-se a falsidade desta acusação, mas a campanha de descrédito e de isolamento prosseguiu. Embora os inquéritos policiais tivessem sido abandonados, Mellaart foi proibido de voltar a trabalhar em escavações arqueológicas turcas, onde realizara já diversas descobertas importantes.
Nos bastidores da cena trabalhavam inimigos secretos e influentes de Mellaart. Mas porque tentavam desacreditá-lo, sugerindo que inventara uma história que lhe prestigiasse a carreira? Mellaart já desfrutava de reputação mundial: não necessitava de golpes publicitários.
E quem era Anna? Foi por pura coincidência que encontrou Mellaart nesse dia no comboio? Ou foi ali «colocada» por alguém que sabia que o seu bracelete dificilmente deixaria de despertar a atenção do arqueólogo?
Ventilou-se uma teoria segundo a qual Mellaart teria sido o engodo numa astuta ratoeira preparada por um bando de contrabandistas que ocultara o tesouro Dorak, a fim de o vender. Os contrabandistas saberiam que o valor do seu saque no mercado negro mundial sofreria um aumento considerável se o tesouro fosse declarado genuíno por um perito insuspeito com a reputação de Mellaart. O artigo publicado no Illustrated London News com a opinião autorizada do arqueólogo confirmava a autenticidade das peças, que foram talvez embarcadas e recebidas por compradores clandestinos em todo o mundo.
Se esta teoria corresponde à verdade dos factos, a verdade sobre Anna e o tesouro desaparecido está provavelmente enterrada para sempre - por detrás das portas de alguns dos mais ricos e menos escrupulosos coleccionadores de arte mundiais.".
O grande livro do maravilhoso e do fantástico
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